terça-feira, 29 de julho de 2008

OSSOS DO OFÍCIO

Mesmo nas grandes instituições acontecem coisas inusitadas. Pouco antes das empresas se informatizarem a chegada de um chefe de seção provocou a maior confusão no setor de cadastramento.
Querendo mostrar serviço e inovar o recém-chegado, de plano, implicou com a irregularidade do tamanho das fichas do arquivo. Para deixar tudo com bom aspecto determinou que todas as fichas, dai por diante, deveriam ter o mesmo tamanho. Quanto as antigas, não teve dúvidas, mandou que o contínuo cortasse as partes que excedessem ao modelo padrão. A ordem foi executada cabalmente, sem nenhum critério.
Nasceu assim o arquivo intitulado “MULA SEM CABEÇA”. As fichas tinham todos os dados, menos o nome do cliente.

segunda-feira, 28 de julho de 2008

MEMÓRIAS DE UMA PARTEIRA – parte 4

Sempre fui uma pessoa de riso fácil e ter que reprimi-lo me custava muito esforço. Ponha-se no meu lugar ante uma cena assim: Uma mulher em trabalho de parto, gemendo e, nesse sufoco, com um chapéu de homem enterrado na cabeça acreditando que com essa "simpatia" a criança nasceria logo, sem problemas...
Muitas mulheres se revoltavam na hora do parto e furiosas agrediam com palavras o marido. Por culpa deles é que estavam sofrendo tanto. Uma vez uma dessas parturientes, revoltada, procurava os chinelos porque queria levantar-se e se matar... Tive que lembrá-la que era melhor ir descalça. Assim pegaria uma pneumonia e o problema estaria resolvido. Mas o melhor seria que ela cooperasse e não ficasse se lamuriando. Até os animais diante dessa situação se acomodavam. A mulher percebeu o absurdo do seu comportamento, aquietou-se e logo depois a criança nasceu. Enternecida, com o filho nos braços, sorria. Pensei: Daqui a um ano, quando muito, novamente estarei aqui!
Alguns maridos se mostravam solidários com o sofrimento de suas mulheres e procuravam ajudá-las a seu modo.
Eis um caso que, mesmo depois de passar uma noite acordada, sem nenhum conforto, cheguei em casa rindo. Meus familiares ficaram curiosos com esse acesso de bom - humor. Contei o que acontecera. Durante o parto escutei um barulho esquisito: correria e falatório em volta da casa. Espiei pela janela e vi uma cena estranha. O "futuro papai", arreado como um cavalo, corria em volta da casa e um outro homem o chicoteava sem piedade. Ante meu espanto, a sogra da parturiente esclareceu:
- Meu filho está ajudando a mulher parir sem que ela sofra muito, dona.
Pois é, sem anestesia, era assim que os partos aconteciam...
Não é mesmo para dar saudade? Ao fazer essa retrospectiva não pude deixar de comparar todos esses acontecimentos com os que ocorrem agora. Quantas modificações!
As mulheres têm acesso a educação, estão se politizando e ganhando um lugar ao sol. Elas dispõem de acompanhamento médico desde que engravidam, fazem cursos para melhor entenderem as modificações que estão ocorrendo nos seus corpos, podem até saber o sexo do filho que esperam, marcam o dia e hora para o parto (geralmente uma cesariana)... E as crianças de proveta, então? Dizem até que já há possibilidade de se escolher o sexo da criança! E pensar que antigamente as crianças costumavam chegar a qualquer hora do dia ou da noite!
Mas, ao mesmo tempo, os jornais e a TV mostram que mesmo numa grande cidade ainda há muito daquilo que vi na primeira metade do século XX. E nas outras partes do país? O progresso certamente vai chegando de modo desigual e os bolsões de ignorância, de atraso, persistem em maior ou menor escala.
Na atualidade, muitas mulheres, tal como aconteceu comigo na primeira metade deste século, estão vivenciando a mesma problemática.Com ou sem Dr. Langgaard, estão ajudando a criançada vir ao mundo. Oxalá elas possam, no futuro, sentir a alegria que desfruto agora.
Sinto-me feliz por ter encontrado pessoas maravilhosas que me estimularam a estudar e a libertar-me de crendices. Dando-me essa oportunidade, consegui melhorar a vida de muita gente e, por que não, a minha também!

sábado, 26 de julho de 2008

MEMÓRIAS DE UMA PARTEIRA – parte 3

A notícia do nascimento de uma menina, não raras vezes, era recebida pelos maridos com desprezo e desagrado. E, pior ainda! Culpavam a mulher pelo acontecimento. Era preciso, nesses casos, enfrenta-los e isso eu fazia com firmeza e indignação. Felizmente, tive sorte, nenhum deles ousou desdizer-me. Ah! Que pena! Naquele tempo eu também nada sabia de genética. Como eu gostaria de lhes dizer que os “culpados” eram eles!
Eis alguns casos que mostram bem o estilo de vida de parte da minha clientela e as condições em que viviam.
. Uma noite, num casebre, assistia uma mulher quando ouvi um ronco esquisito. Ora, o marido estava ali bem acordado, a mulher gemendo. De quem seria aquele ronco? Perguntei ao homem que barulho era aquele.
- Não é nada, dona. E' uma porca que costuma dormir em baixo da cama.
Fiquei arrepiada! Calcule se a porca, sentindo o cheiro de sangue, tivesse seu apetite despertado e atacasse a criança!
Com muito jeito consegui que o homem retirasse o animal do quarto embora ele insistisse que a porca era mansa... Como faze-lo compreender o absurdo da situação e os riscos decorrentes dela?
Sempre visitei minhas clientes após o parto. Precisava orientá-las nos cuidados pessoais e do nascituro. Por causa disso assisti 2 situações inusitadas.
Certa vez, não encontrando a paciente em casa, fui informada que ela fora ao rio lavar as roupas que usara na véspera, ocasião do parto. Não foi só isso. Daí a pouco ela estava de volta carregando, na cabeça, uma bacia cheia de roupa lavada...
A outra vez foi quando atendi a esposa de um comerciante. Ele estava viajando. A mulher era jovem, bonita e tinha longas tranças. Estava ansiosa à espera do terceiro filho. Já tinha duas meninas e “estava devendo ao marido um filho homem”. Seu desejo foi satisfeito: o garoto nasceu forte e bonito. A mulher ficou muito, muito feliz! Mal podia esperar o marido chegar!
No dia seguinte encontrei a parturiente sem as tranças. Estimulada pelas cunhadas, mais modernas, aproveitara a ocasião do nascimento do filho homem para cortar suas tranças, tão apreciadas pelo marido.
Passados uns dias resolvi dar uma passada na casa dela. Era na cidade, próxima a minha casa. Com surpresa encontrei a mulher com um lenço na cabeça e as tranças repostas. Com olhar triste e cheia de hematomas contou-me que o marido lhe dera uma surra por ter cortado o cabelo, mesmo ela estando de “resguardo” e de lhe ter dado um filho homem. Como sempre, não podia deixar por menos. Chamei o marido e manifestei toda minha indignação. Disse-lhe coisas que, se ele ainda estiver vivo, não terá esquecido. O homem baixou os olhos e não reagiu.
Mas, não era só tristeza. Havia também situações engraçadas, outras de revolta e também as de solidariedade.
Continua...

terça-feira, 22 de julho de 2008

MEMÓRIAS DE UMA PARTEIRA – parte 2
De inicio planejei mudar-me para uma cidade maior e fazer um curso para o magistério. Meus pais não aprovaram a idéia e se recusaram a me acompanhar. Sem a ajuda deles não poderia estudar e cuidar de quatro crianças ao mesmo tempo.
Outra tentativa: Receber em casa, como pensionistas, algumas professoras recém chegadas à cidade. Assim, eu e as crianças teríamos a possibilidade de ter bons modelos no uso da linguagem para contrabalançar o espanhol falado pelos meus pais. Era, também, um reforço na economia doméstica, embora não suficiente.
O acaso abriu-me um novo caminho, tal como o Dr. Langgaard descrevera. Uma vizinha entrou em trabalho de parto e não havia ninguém para ajudá-la. Foi aí que precisei agir. Tive calma e as lições todas daquele livro maravilhoso vieram à minha mente. Foi um sucesso. Experimentei uma alegria muito grande em participar da chegada de uma criança ao mundo. Dessa vez eu não era a que "dava a luz", mas a que contribuía para que tanto a mãe quanto a criança fossem bem sucedidas.
A notícia saiu da cidade e foi para o campo. As antigas clientes do meu marido, quando engravidavam, passaram a me procurar para garantir a minha presença quando chegasse o grande dia.
Casei-me posteriormente com um farmacêutico. Com ele tive a oportunidade de adquirir novos conhecimentos importantes para minha profissão. Durante muitos anos assisti centenas de mulheres na minha cidade e só deixei de fazê-lo quando, na década de Quarenta, mudei-me para São Paulo. Uma vez na Capital não mais havia razão para uma “curiosa” exercer essa atividade. Só voltei a fazê-lo para assistir minhas filhas quando da chegada de meus netos. Foi uma experiência maravilhosa! Elas confiaram em mim e permitiram que eu fosse a primeira pessoa a tocar naquelas crianças, minha continuidade no mundo!
Há mais de quarenta anos deixei de ser parteira. Agora, quase centenária, lembro com saudade daqueles tempos.
Atendi mulheres de todas as classes sociais e arranjei um sem número de afilhados. Até hoje tenho muitos amigos entre as crianças que "peguei". Muitas vezes, mal chegava de um parto e já tinha algum marido aflito me esperando... Reabastecia minha maleta e lá ia eu...
Não perdi nenhuma paciente ou criança nos 20 anos que exerci essa atividade. É bom lembrar que na época em que fui parteira os antibióticos praticamente não existiam. Eles surgiram no final da 2ª guerra mundial. Até então só dispúnhamos das sulfas que eram de difícil tolerância. O que nos restava era ter muito cuidado com a higiene. Isso não era nada fácil ante tanta ignorância e crendices. Mas era preciso tentar e insistir! Com perseverança consegui difundir muitos conceitos básicos de higiene entre as minhas clientes e seus familiares.
Havia, entretanto, um outro fator que pude observar nas muitas casas que freqüentei e que me aborrecia bastante. Era a posição inferior que a mulher ocupava dentro da família.. Não era uma regra geral, mas bastante freqüente. Vi moças bonitas se casando e rapidamente envelhecendo... Muito trabalho, gravidez seguidas, falta de tempo e incentivo para cuidados pessoais acabavam apagando o sorriso de seus lábios...Muitas delas nunca desfrutaram do companheirismo, elemento essencial na vida a dois. Quantas vezes encontrei parturientes acompanhadas apenas por vizinhas pois o marido aproveitara a ocasião para fazer uma pescaria...
Continua...

segunda-feira, 21 de julho de 2008

MEMÓRIAS DE UMA PARTEIRA - parte 1

MEMÓRIAS DE UMA PARTEIRA - parte 1
Nem sempre a gente escolhe a profissão. Muitas vezes ela nos pega sem nenhuma chance de opção. O mais engraçado é que mesmo nessas circunstâncias podemos nos apaixonar por ela. Foi o que aconteceu comigo.
Filha de imigrantes, nasci e fui criada na zona rural. Não freqüentei escolas porque naqueles tempos achavam que as mulheres não precisavam e não deviam ser letradas. Isso me deixou muito triste. Meu irmão resolveu então me ensinar a ler. Fui, portanto, alfabetizada em espanhol.
Aos dezessete anos encontrei o meu companheiro de vida. Nós éramos muito diferentes. Ele era médico, muito culto e bem mais velho do que eu. Como conciliar tamanha distância cultural? Os apaixonados sempre acham uma saída para esses desafios. Ele se propôs a me ensinar e eu, não tive dúvidas, empenhei-me em aprender. Estava disposta a superar todos os obstáculos, a “ir além”.
Fiquei encantada com esse mundo novo que se abria para mim. Os livros que pouco a pouco iam chegando às minhas mãos, as boas maneiras, o uso adequado das roupas... Ah! Meu Deus! Com um professor tão criativo, tão paciente, aprender, tornou-se para mim uma obsessão. Nosso casamento durou sete anos e nesse espaço de tempo estudei muito e tive quatro filhos.
Quando meu marido percebeu que eu me interessava pela sua profissão começou a me ensinar muita coisa: esterilizar os instrumentos, aplicar injeções, fazer curativos e também noções sobre partos. Pôs nas minhas mãos o livro "Arte obstétrica ou Tratado dos partos "do Dr. Langgaard.
Contou-me que o autor queria que as mulheres tivessem mais informações a respeito do assunto. Quantas vezes elas precisavam socorrer outras nessa situação e, muitas, não tinham a menor idéia de como fazê-lo. O livro tratava do assunto com simplicidade, era bem ilustrado e se destinava às "curiosas" que jogavam com sua experiência e com uma série de crendices. Visava, portanto, orientá-las e ajudá-las no desempenho da tarefa que lhes era imposta.
Encantei-me com a preocupação desse autor e procurei aprender tudo que ele se propusera a ensinar. Mal sabia o quanto seria importante eu ter dominado o conteúdo desse livro!
Quando enviuvei tinha filhos para criar, pais idosos e ninguém para me ajudar. Meu marido amealhara nesses anos um certo patrimônio. Na década de Vinte a situação econômica do mundo não era das melhores. Os inquilinos não pagavam os alugueres e as tentativas para cobrar as dívidas que muitas pessoas tinham com meu marido foram, maiorias das vezes, em vão. Negar dívidas às viúvas era uma prática comum, naqueles tempos, Elas que cuidassem de seus direitos, diziam. Foi o que fiz para surpresa de muitos deles: embarguei partidas de café no porto de Santos, protestei títulos, impedi a tradição de propriedades... Apesar de humilhados por terem sido vencidos por uma mulher, tiveram de me pagar. Assim mesmo, logo as minhas provisões estariam se esgotando. Precisava trabalhar. Mas, se para os homens a busca de trabalho não era fácil, para as mulheres, então, nem é bom pensar!
Continua...

quinta-feira, 17 de julho de 2008

O PODER DE UMA FRUSTRAÇÃO

O PODER DE UMA FRUSTRAÇÃO –parte - 3
- Cristina, Cristina, acorda! Vamos, acorda!
Abriu os olhos ainda chorosos e viu-se diante do marido que, aflito, perguntava:
- É um pesadelo? Ou você está sentindo alguma dor?
Cristina sentou-se na cama e continuou soluçando. O marido, com seus braços, a envolveu ternamente e procurou tranqüilizá-la.
- Foi apenas um pesadelo. Estou bem, disse Cristina com dificuldade sem conseguir parar de chorar.
O pesadelo acabara e toda a problemática nele levantada, não mais existia. O que a angustiava era a insensatez que emergira do seu inconsciente. Para realizar o seu desejo eliminara todos os familiares, até do marido, seu querido companheiro de tantos anos! Como uma simples notícia de jornal pudera, de modo tão radical, acordar uma velha frustração e arquitetar um plano tão absurdo para realizá-lo? Talvez Freud pudesse explicar... Ela, simplesmente, não entendia.
Aninhada nos braços do marido, mais calma, decidiu. Não contaria para ninguém o seu sonho maluco. Seria o seu segredo e, quem sabe, um dia o esqueceria.

segunda-feira, 14 de julho de 2008

O PODER DE UMA FRUSTRAÇÃO – Parte - 2

De repente uma idéia lhe acudiu. Ainda não chegara aos sessenta anos, tinha saúde, boa situação econômica e todos aqueles que criavam obstáculos à realização do seu sonho não mais pertenciam a este mundo... Poderia tentar, pensou. Será que o Brasil teria profissionais nessa especialidade?
Estava decidida. Agiria de acordo com sua vontade. Rapidamente entrou em ação. Informou-se, procurou especialistas, fez exames e partiu para todos os preparativos. Estava ansiosa. Atingiria seu objetivo?
Finalmente, os sonhos estavam prestes a se realizar. Conseguira engravidar! Aleluia!
Passada a fase de euforia, enquanto a barriga se avolumava, ela começou a analisar a situação. Durante a gravidez teria que enfrentar a curiosidade dos conhecidos e todo tipo de comentários. Quando a criança nascesse teria que executar as tarefas próprias de uma mãe de vinte, trinta ou mais anos... Mas ela teria sessenta... E para criá-la, educá-la? Seria capaz de orientá-la para as exigências do mundo de agora, em mudança constante e de aceleração cada vez mais rápida? Como ela estaria mental e fisicamente quando a criança atingisse a adolescência? Como cada uma veria o mundo? Seriam visões compatíveis?
Mas a indagação mais terrível ela ainda não formulara. E, de repente, isso aconteceu! Quem se encarregaria desse rebento tão desejado se a mãe temporã falecesse? Sendo viúva, sem outros familiares, a quem caberia cuidar dessa criança, produto de sua obsessão? Depois dessas reflexões chegara a conclusão de quanto havia sido egoísta, egocêntrica mesmo! Só pensara em satisfazer o seu desejo, nada mais! E desatou num pranto convulsivo.
Continua...

quinta-feira, 10 de julho de 2008

O PODER DE UMA FRUSTRAÇÃO - Parte - 1

Cristina leu o artigo no jornal e ficou pensativa. Como a ciência evoluíra! Passou em revista a sua vida. Como filha única tivera uma infância solitária. Viver, crescer entre adultos tinha sido bom, não podia negar, mas com outras crianças certamente teria sido muito melhor. Quando casasse gostaria de ter muitos filhos. Sonhava com isso.
Aos 20 anos encontrara aquele que seria o seu companheiro de vida. Apaixonados logo se casaram. O tempo passou e para decepção do casal a gravidez não acontecia. Todas as tentativas de tratamento foram em vão. Os especialistas não diagnosticavam nada de anormal no casal, mas...
Quando surgiu a possibilidade do bebê de proveta ela ficou entusiasmada. Estava ali a sua grande chance e não queria perdê-la. Agora se contentaria com um filho só. Consultou o marido. Ele não concordou, pois achava que as técnicas eram ainda muito recentes e o risco era muito grande. Todos os argumentos dela não o convenceram. Gostaria de ter filhos, dizia ele, mas sem correr o risco de perder a mulher.
Acenou, então, com a possibilidade de adotarem uma, duas crianças... Também não teve o apoio dele e nem dos familiares. Alegavam que ainda eram moços e, quando menos se esperasse, a gravidez aconteceria. E o tempo foi passando...
Ela continuou acompanhando todo progresso científico nesse setor. O marido continuava firme na sua posição e ela foi perdendo a esperança. Com a chegada da menopausa, acabou sepultando sua frustração. Não pudera ser mãe e também não seria avó...
Agora essa notícia no jornal: “Mulher italiana engravida aos 60 anos!” Por mais que tentasse se livrar de pensar no assunto, não conseguia. E os dias foram passando...
Continua....

terça-feira, 8 de julho de 2008

Cuidado com as ONGS

Nasci, estudei e lecionei no interior paulista e pude constatar a dificuldade em ler livros de minha predileção. Muita gente do interior não lê porque não encontra livros de sua preferência e não é por desinteresse. São poucas as escolas e bibliotecas públicas que têm um acervo significativo, os livros,via de regra, são caros e as livrarias com grande variedade de temas são raras.
Agora, como professora aposentada, quis minorar essa situação e contribuir para que o hábito de leitura se desenvolva nessas regiões. Como atingir esse objetivo? Na impossibilidade de faze-lo pessoalmente procurei uma ONG . Depois de muito pesquisar escolhi o Fundo de Solidariedade e Desenvolvimento Social e Cultural do Estado de São Paulo e fiz a seguinte proposta, por carta e por telefone:
Doar, entre outros, 200 livros de minha autoria – “Elas, as pioneiras do Brasil – A memorável saga dessas mulheres” – para Escolas e Bibliotecas Públicas do interior. É uma História do Brasil sob a ótica feminina onde reuni a biografia de 60 mulheres que se destacaram desde o descobrimento até nossos dias. Através desse enfoque pude mostrar a luta do gênero para alargar seu espaço deixar de ser uma a cidadã de segunda classe.
Fiquei decepcionada quando recebi o agradecimento de uma Creche da cidade de São Paulo pela minha doação de 177 livros – Elas , as pioneiras do Brasil. Gentilmente me contaram como fariam a distribuição deles, isto é, para particulares. Ora livro doado sem auscultar a preferência presenteado é um candidato a ser esquecido numa estante ou então ir parar num SEBO. Nas Escolas e Bibliotecas isso não acontecerá pois estará sempre a disposição de muitas pessoas sem qualquer ônus para elas. Se a ONG tivesse doado todos exemplares do livro infantil “Pois é!!! Cada um na sua...”, também da minha autoria, para a Creche, mesmo não sendo do interior paulista, eu ficaria contente pois estaria contribuindo para que o habito de leitura fosse trabalhado.
Em suma, como professora aposentada, com baixo salário, em sã consciência, não doaria livros no valor de RS$7.000,00 (sete mil reais) para serem distribuídos aleatoriamente, sem qualquer critério. Fizeram gentileza com chapéu alheio! Será que, pelo menos, os 23 livros restantes foram parar em alguma escola ou biblioteca publica do interior paulista?

sexta-feira, 4 de julho de 2008

Parte 3
Certamente as jovens estão inseguras. Isto acontece nas formaturas, mas é porque esperaram demasiado da escola. Ninguém pode ter a pretensão de sair de um curso pronta e acabada como Minerva da cabeça de Júpiter. A escola fornece muitos elementos, mas apenas como ponto de partida. Eles devem ser trabalhados, ampliados, reformulados e, em alguns casos, substituídos. Dai a importância de uma educação permanente.
As jovens foram iniciadas no plano técnico, científico e filosófico. Mais do que encher suas cabeças de informações, a escola se preocupou em fazê-las pensar. Convidou-as a examinarem suas próprias vidas para que descobrissem quais os propósitos que as guiavam na existência, o que apreciavam acima de tudo, qual o conhecimento que consideravam mais valiosos e assim por diante. Desta auto-análise emergiria a filosofia de vida de cada uma. Salientou ainda que sem uma filosofia da educação as educadoras seriam superficiais e como tais poderiam ser boas ou más. Segundo G. Kneller: “se forem boas, serão piores do que poderiam ser e, se forem más, piores do que precisavam ser”.
Oxalá todas essas considerações estejam povoando essas jovens cabeças. Só assim descobrirão que o magistério é compensador, pois permite que participemos, milhares de vezes, da mais bela das tarefas: acompanhar o desabrochar de uma criança!

quarta-feira, 2 de julho de 2008

REFLEXÕES DE UMA PROFESSORA NUMA FESTA DE FORMATURA

Parte 2
As jovens conhecem bem esses elementos e sabem que eles apenas garantem a autoridade da liderança, mas que não contribuem, em nada, para diminuir as tensões que podem estar latentes ou em ato nas relações professor - aluno. Viveram essa situação em todos os seus anos de escolaridade. Essa liderança só é real quando o professor tem prestígio, essa irradiação insubstituível da personalidade, que tão bem equaciona competência, calor humano, capacidade de dar a cada um o que é seu, otimismo, espírito aberto, bom humor e o dom de manter a distância social necessária entre professor e aluno, naquele ponto ótimo que não dá azo ao favoritismo. Decorre, em certos casos, de um verdadeiro magnetismo pessoal que faz lembrar a velha noção teológica de carisma usada por Max Weber.
Sem um certo prestígio os professores se tornam impopulares e as matéria que lecionam deixam de ser atraentes. Diz Robert Ellis: “Um ministro agreste, de temperamento desabrido, breve se acharia pregando a bancos vazios; médicos e advogados desse tipo constrangeriam os clientes a procurar outros profissionais mais agradáveis; mas as leis de freqüência escolar compulsória e dos cargos efetivos, bem como a tradição habilitam o professor impopular a permanecer, ano após ano, formando novas levas de inimigos.”
Será fácil manter acesa essa chama e equacionar todos esses elementos? Não. Há uma série de desvantagens.
A escolha do magistério como profissão corresponde a um voto de pobreza. O remédio é dobrar a jornada de trabalho e, portanto, dispor de poucas oportunidades de atualização e lazer. A presença do mau aluno é um entrave para aqueles professores que ainda não resolveram enfrentar o problema objetivamente. Como? Tentando recuperá-lo e, para tanto, deve começar por uma auto-análise. A razão da indiferença do aluno pode estar no próprio professor...
Continua...